Quinta Vale da Lama: Quinta de turismo ecológico onde se descansa em contacto total com a natureza – Nita Barroca

por Marta Belchior

A Quinta Vale da Lama é um lugar tranquilo e sustentável, cheio de ideias características para quem procura descansar em comunhão com a natureza. Entrevistamos Nita Barroca, Diretora da Quinta Vale da Lama, para saber mais sobre este projeto e as suas práticas sustentáveis.

Fale-nos um pouco sobre como nasceu a Quinta Vale da Lama e a sua  história. 

A Quinta Vale da Lama nasceu de um sonho, meu e do meu marido Walt,  de criar um pequeno ecossistema onde pudéssemos aprender, partilhar e  desenvolver uma Quinta sustentável e, paralelamente da necessidade de  encontrar um espaço alternativo para as atividades da associação Projecto Novas Descobertas. Esta associação sem fins lucrativos, criada por mim  em 1994, realizava campos de férias e algumas formações para crianças e jovens na Quinta Santa Barbara em Monchique que ardeu nos incêndios de 2003, ficando assim sem um espaço.

Para vocês “A sustentabilidade não é suficiente”, por isso adotam a agricultura regenerativa. No que consiste e qual o impacto para o ambiente?

Sim, na nossa opinião a agricultura sustentável já não é suficiente é preciso  ir mais profundo e regenerar, restaurar, armazenar o carbono nos solos e voltar a dar vida aos mesmos, pensando sempre nas gerações futuras e não  só na atual.  Manter o carbono nos solos é uma das nossas preocupações.  A agricultura regenerativa preocupa-se com a saúde dos  solos a longo termo.  Para termos alimentos saudáveis temos de criar solos saudáveis. 

Os problemas climáticos atuais são enormes e irreversíveis, abusamos e explorámos o nosso planeta.  Os nossos solos e eco sistemas foram mal tratados com produções de cultivo intensivo e com o uso de químicos que o deterioraram, juntando-se a falta de água.   

Para os regenerar, usamos diversas técnicas: não removemos os solos, ou se o fizermos fazemos o mínimo possível; na produção agrícola não termos solos nus, que secam mais rápido, é importante cobri-los com matéria orgânica; plantamos todos os anos árvores e arbustos no Outono para criar bio diversidade; não usamos químicos; temos certificação bio nas nossas hortas de vegetais e falta um ano para os pomares serem certificados; fazemos compostagem, bokashi e vermi-compostagem, usando em cada uma destas técnicas restos orgânicos (das nossas casas e do nosso restaurante vegetariano), dos restos da produção de vegetais quando os preparamos para vender nos dois mercados de Lagos, trituramos os restos orgânicos da quinta como das podas das arvores, da vinha e arbustos; não fazemos queimadas; fazemos muitos dos nossos bio fertilizantes; temos uma floresta comestível, com imensa diversidade e densidade; recriamos os nossos solos para os mesmos poderem reter mais água, com escombros e outras técnicas para reencaminhar a água e diminuir a erosão dos solos; usamos painéis solares para a irrigação; usamos o holistic management temos também muita sorte em ter colaboradores que acreditam na nossa visão e têm bons conhecimentos. 

Adoramos servir os nossos vegetais e frutas no nosso restaurante e com os excedentes dos mesmos produzir as compotas, vinagres, kombucha, piri-piri, kimchi, e muitos outros produtos processados.

O Design de Permacultura é uma abordagem para a concepção de ecossistemas que sejam Eficazes, Eficientes e Ecologicamente Corretos. Como é que isso se reflete na Quinta? 

Quando comprámos a quinta tiramos um curso de Permacultura que foi impulsionador no design dos nossos eco sistemas.  Por aqui também  passaram muitas pessoas com conhecimento nesta área que nos ajudaram  a criar e recriar os nossos eco sistemas.  

A Permacultura tem por base 3 éticas; cuidar da terra, das pessoas e a partilha dos excedentes o que faz todo o sentido para nós e para a nossa visão.  Quando desenhamos os nossos espaços e habitações baseamo-nos  nestas éticas e nos seus princípios. Alguns dos princípios da permacultura  que usamos são: captação e armazenamento de água, valorizar os recursos  renováveis, não produzir desperdícios e valorizar a diversidade. Outro  principio a ter em consideração quando criamos eco sistemas é a observação da natureza e o uso de soluções lentas e pequenas… nisto falhamos por vezes, temos uma quinta grande 42 hectares e nem sempre fizemos as coisas lentamente, o que criou alguns erros ao longo do processo. Também através da permaculura me apercebi da importância da  criação de ciclos fechados e não lineares, tal como na natureza…tudo é re utilizado. 

A permacultura é sem duvida um bom guião para desenhar eco sistemas.

As questões ambientais, nomeadamente de eletricidade, água e resíduos, são um desafio para gerir. Que estratégias internas têm implementadas nesse sentido e que resultados têm obtido? 

Sim, desde a sua construção que o nosso alojamento turístico Casa Vale da Lama Eco Resort foi criado com soluções para dar resposta aos problemas ambientais.  Temos painéis solares -térmicos e fotovoltaicos, tem um posicionamento passivo com bom isolamento térmico, sistema de esgotos com tratamento natural, detergentes e shampos nos quartos ecológicos,  capta a água da chuva com cisterna, charca e aproveitamento de águas para  irrigação de espaços verdes. O aquecimento da casa e dos quartos no  inverno e águas quentes para duches feitos com painéis solares, lareira e  gás natural. A limpeza da piscina é feita através dum processo de salinização.  Não usamos químicos nos nossos jardins.  O nosso restaurante  é vegetariano/vegan “da horta ao prato”, onde chegam os nossos vegetais e  frutas da quinta. Temos mobilias feitas com materiais naturais e “upcycling”.

Mas todos nós podemos repensar o que fazemos e inventar sistemas com  ciclos fechados inteligentes.  Por exemplo a máquina de lavar roupa da  minha casa irriga diretamente alguns dos arbustos do meu jardim. 

E agora que estamos no processo de desenhar o aumento do nosso Eco  resort, com um restaurante maior, mais quartos e espaços de sala de aula, estamos a estudar métodos mais inovadores, eficientes e eficazes para  atingir o standard de carbono zero e adicionar soluções para medir a nossa  pegada ecológica de maneira transparente.

O sistema de Pastoreio Holístico é um método para reconduzir as  pastagens e os animais de pasto que co-evolveram com eles para uma relação mutuamente  benéfica. Explique nos melhor este conceito e quais os benefícios do mesmo. 

Admiramos muito este sistema de Allan Savory, que o mesmo criou observando como os animais se movimentavam no seu habit natural… O  importante é não manter os animais no mesmo local durante muito tempo,  para não sobrecarregar e compactar o solo, e para o eco sistema ter tempo  para se regenerar, e sim move-los no pastorio de forma sistémica, assim  eles ajudam na fertilização dos solos. Na nossa zona de pasto utilizamos  ovelhas nesta forma rotativa, assim como usamos as galinhas neste sistema  entre as nossas arvores de fruto, para ajudar na fertilização dos solos e  retirar as ervas daninhas. É um tractor natural vivo…

 

A Quinta Vale da Lama é, já por si só, um alojamento inteiramente ligado à sustentabilidade. Para além do vosso core business participam em mais  alguma iniciativa que promova a sustentabilidade? 

Vemo-nos como parte integrante dos movimentos globais regenerativos, tais como o Openfood e outros com preocupações na alimentação  local/circular, como a Cooperativa da Terra,  um exemplo local. “Think globally, act locally” é a nossa linha de  pensamento.  

Tudo revolve à volta do que comemos, a nossa prioridade é comida sã que deve vir de proximidade – Sazonal, Local, e Orgânica, (SLO FOOD : ).  No nosso caso quando não produzimos na quinta compramos cada vez mais  aos produtores locais. Também fazemos parte da criação do Vivo Mercado de Lagos, um mercado preocupado na produção local sonhando que um dia  todos os seus produtores e vendedores tenham produção orgânica. 

A educação é a nossa grande paixão daí cedermos o espaço na nossa quinta à associação Projecto Novas Descobertas que trabalha com crianças,  jovens e adultos na consciencialização e educação para a Regeneração. O  trabalho com as escolas é fundamental para a regeneração do futuro de todos nós humanos e da terra. Adoramos ver as crianças e jovens a passear pela nossa quinta, conectando-se com a natureza. 

Também em parceira com a associação Projecto Novas Descobertas, outras  instituições e pessoas locais realizamos dias abertos e campos  regenerativos para servir a comunidade local com actividades educativas,  culturais e regenerativas. 

Nita Barroca

Tem 59 anos, é portuguesa, Assistente Comunitária, com curso tirado em Toronto, onde viveu com o Walt nos primeiros anos de casamento. Apaixonada pela educação, regeneração e inclusão em harmonia de todos os eco sistemas. É, atualmente, diretora na Quinta Vale da Lama.

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