ZOURI: Calçado feito a partir de lixo das praias – Adriana Mano

por Marta Belchior

Adriana Mano dá-nos a conhecer mais sobre o seu projeto, a ZOURI, uma marca de calçado sustentável que aproveita o lixo encontrado nas praias da costa portuguesa na sua produção.

Como nasce a Zouri, e qual a origem do seu nome? 

Em 2016, participava numa ação de limpeza de uma praia quando me lembrei que podia aproveitar os resíduos de plástico recolhidos para criar uma marca de sapatos. Comecei por fazer desenhos, ainda sem levar o projeto muito a sério, até me candidatar a um prémio da Universidade do Minho, que ganhei. No fim desse mesmo ano, criei a empresa e lancei a primeira linha de sapatilhas feitas com plástico recolhido das praias, que é incorporado nas solas. A estrutura é composta por materiais orgânicos e naturais (ou biomateriais), como resíduos de maçã e ananás, entre outros. As Zouris são o calçado tradicional japonês típico do Kimono. Na altura decidimos este nome pela estética minimalista e filosofia de respeito pela natureza que continha.

 

A Zouri comercializa produtos 100% nacionais. Sentem que os clientes valorizam os produtos locais e procuram conhecer a sua origem? 

Cada vez mais sentimos que o mercado e a própria indústria do calçado estão em mudança. O mercado procura produtos produzidos localmente, com materiais não tão nocivos ao ambiente. Existe um maior aumento da literacia ambiental associada a esta indústria e a tantas outras. Isto é fruto das enormes campanhas sensibilização que todos assistimos diariamente pelos variados canais de informação. Em todas as nossas caixas de sapatos existe um papel no qual identificamos todos os produtos utilizados no fabrico daquele par, o nome das pessoas envolvidas na produção e comercialização, o nome das praias onde retiramos o plástico agora contido naquelas sapatilhas.

Quais as matérias-primas utilizadas no fabrico dos sapatos? 

As solas são produzidas em borracha natural e plástico recolhido das praias portuguesas, as palmilhas são feitas a partir de materiais reciclados e as gáspeas, a parte superior do sapato, com materiais naturais e biodegradáveis, como o algodão orgânico, linho, cânhamo, ou biomateriais como o pinatex, um tecido à base de folhas de abacaxi, ou pele de maçã. Todos os materiais são vegan e certificados. Todo o calçado ZOURI é fabricado em Portugal.

 

De que forma a produção dos produtos é sustentável? Não em relação ao produto final, mas sim em relação à produção completa do produto. 

A nossa produção é 100% nacional, as matérias-primas sustentáveis com certificações de comércio justo e com produção o mais próxima possível. A nossa ideia sempre foi centralizar ao máximo todos os materiais e processos para que as emissões nocivas associadas ao produto fossem as menores. Os produtos e matérias-primas que são utilizadas obedecem a rigorosas certificações de forma que a sua produção tenha o menor impacto possível nas comunidades, terrenos e campos. Estamos orgulhosos por ter um calçado sustentável de elevada durabilidade e com um conforto extremo. E claro, temos o plástico recolhido das nossas praias portuguesas transformando-o e reutilizando-o.

Tendo em conta que se trata de uma marca que luta contra o desperdício, estão presentes em algumas iniciativas/eventos nesse sentido, para além da venda de produtos sustentáveis? 

Tentamos ser os mais justos e fiéis aos valores da marca, pois se atuássemos de forma contrária, estaríamos a comprometer todo o nosso imenso esforço por criar e manter um projeto como este. Quando falamos de iniciativas com objetivos comerciais, tentamos sempre perceber junto das organizações quais os valores e que tipo de objetivos estão na sua génese, pois a ZOURI é muito mais do que uma marca que comercializa calçado vegan e sustentável. Nos últimos dois anos, a ZOURI juntou mais de 1500 voluntários para participarem na recolha e limpeza de praias portuguesas, tendo recolhido mais de 5 toneladas de plástico, juntamente com alguns municípios e ONG por todo o país. Fizemos dezenas de ações de sensibilização em escolas por todo o país, e múltiplas palestras por universidades, focando-nos no nosso processo com o objetivo de podermos inspirar os mais novos e mais velhos. O nosso objetivo é nos próximos dois anos criar programas ambientais de sensibilização por mais de 150 escolas, combinando a criatividade ao potencial que é tornar o lixo plástico numa das matérias-primas mais valiosas do presente e futuro do nosso planeta. Mais do que uma marca, a ZOURI é um movimento.

 

A ZOURI personaliza cada venda que fazem com uma carta com todas as informações sobre os sapatos. Acreditam que isso agrega valor ao produto? 

Essa é a nossa impressão digital. Acreditamos que o cliente tem o direito de saber o percurso do seu produto. Saber que materiais estão lá, quem o fez, que distâncias percorreu e a proveniência das matérias-primas. O futuro só fará sentido assim, e nós queremos trazer esse futuro para o nosso presente. A ZOURI acredita na transparência como pilar base. 

Quais os próximos passos para este projeto? 

Durante estes últimos anos temos contado com o apoio de vários parceiros entre eles voluntários, ONG e municípios. Neste último ano temos colaborado com organização como a Bandeira Azul e a Docapescas neste último caso, sãos os pescadores que vão recolher os plásticos em alto mar e a ação iniciou-se com a Docapescas de Viana do Castelo. Em perspetiva estão parcerias com a de Cascais e a de Ericeira. Queremos alargar a nossa rede de parceiros por todos o país, que significará limpar e recolher mais lixo das praias, e como anteriormente dissemos, queremos criar um plano de ações e formações ambientais por todos o país, desde as escolas às universidades. É urgente sensibilizar todas as gerações para o perigo que o nosso planeta, e nós, enfrentaremos caso não mudemos as regras do jogo.

Iremos continuar a focar-nos nas praias portuguesas pois ainda há muito a fazer. O nosso objetivo é começar a avançar o nosso projeto para Espanha em 2022 e ter presença em mais lojas e distribuidores em todo o mundo (já contamos com mais de 35 países).

Adriana Mano

Com 38 anos, é uma empreendedora social, ativista vegana, trash creative e fundadora da Zouri – From the Ocean. A Adriana acredita nos negócios sociais e positivos como uma força para um mundo melhor. Mente inquieta e pensadora estratégica em diversas áreas: design, ecologia e empreendedorismo. Especialista em marketing, apaixonada por inovação e sustentabilidade. Trabalhou vários anos na indústria do calçado e como consultora de marketing de marcas portuguesas e estrangeiras. O seu objetivo é inspirar outras pessoas a ver o lixo como a matéria-prima mais valiosa das próximas décadas.

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